Quem vê Morais no Parque São Jorge brincando com os novos companheiros de Corinthians não imagina que há pouco tempo seu humor era outro. Acordar e ir treinar no Vasco não lhe empolgava. Pelo contrário. Alvo de forte cobrança, o armador se via perseguido e não rendia. Hoje, contudo, ele reencontrou a alegria de jogar.
Em entrevista exclusiva ao Pelé.Net, o camisa 9 do Corinthians contou como foi sua saída de São Januário, a pressão que sentia, a falta de confiança do elenco do Vasco e por que se esforçou tanto para trocar de clube rapidamente.
"A situação chegou a um ponto insuportável. Sair de casa todo dia era uma luta, então eu precisava ir embora, não tinha jeito", disse Morais. O meia, contudo, tem contrato por empréstimo com o Corinthians e ainda possui vínculo com a equipe carioca.
Cauteloso e sem saber o que acontecerá em seu futuro, ele evita fechar as portas sobre seu eventual retorno a São Januário. Mas seu bom momento atual, suas palavras e sua expressão quando questionado sobre sua vontade deixam claro que voltar para São Januário está longe de ser prioridade. Muito longe.
Na chegada ao Corinthians, você disse que não sentia mais alegria de jogar. Já recuperou essa alegria?
Claro. No Vasco estava muita pressão, era tudo em cima de mim. Quando o time perdia, era minha culpa. Quando ganhava, o mérito era de tudo mundo. Todos esperavam que eu pegasse a bola e driblasse todo mundo. Aqui é diferente. Tenho meu setor para preencher e quando não estou bem, outros decidem. Lá todos estavam pegando no meu pé, imprensa, torcedores...
Quando a situação ficou tão ruim para você lá?
Depois da eliminação na Copa do Brasil para o Sport. A gente perdeu nos pênaltis e eu fui substituído antes. Não quero 'tirar o meu da reta', mas no outro dia saíram matérias falando da minha relação com a torcida. Se em outro dia acontecesse algo pior comigo diretamente, a situação ficaria insuportável. Ali comecei a mexer meus pauzinhos para ir embora.
Mas você já estava com vontade de sair?
Minha intenção era esperar até a janela de dezembro, fazer um bom final de Brasileiro e ir para fora. Mas eu não estava me sentindo bem e não conseguiria aturar mais quatro, cinco meses daquele jeito. A gota d'água foi depois da derrota por 5 a 2 para o Santos. Eu estava suspenso e nem participei da partida, mas no outro dia a torcida veio para cima de mim. Aí decidi largar tudo. Se eu não jogo e todos já vêm me cobrar, no dia em que eu não fosse bem iriam querer me matar.
Está acompanhando o Vasco no Brasileiro e viu a polêmica envolvendo o Tita?
Tenho amigos lá e procuro saber como está a situação. O que aconteceu com o Tita foi muito chato. É complicado uma pessoa que já saiu e não pode fazer mais nada pelo time ficar falando mal de jogador que continua lá. Não vou criticar o Tita porque ele fez de tudo para que eu ficasse, mas é chato falar coisas depois de sair.
Nota da redação: Recentemente, Tita, ex-técnico do Vasco, disparou fortes críticas contra o ex-clube e chegou a dizer que o zagueiro Jorge Luiz não tinha condição de jogar no clube
Você acha que saiu na hora certa, então?
Não saí por causa do momento do Vasco, o time não estava nem na zona de rebaixamento. Saí pelo meu momento. Chegaria uma hora em que não conseguiria mais jogar futebol e isso é minha vida, a carreira é curta. Já estava havia dois, três meses sem jogar o que poderia, meu futebol estava caindo muito e percebi que precisava sair.
Você já disse estar feliz no Corinthians, mas seu empréstimo acaba em junho do ano que vem. Pretende voltar para o Vasco?
Essa é uma situação em que fico em cima do muro. Tenho contrato com o Vasco até 2011 e lá dei meus primeiros passos, cheguei com 13 anos. Mas estou muito feliz aqui e minha intenção é trabalhar forte para ficar no lugar onde me sinto bem. Hoje estou bem no Corinthians, então minha intenção é permanecer. Mas se acontecer de voltar para o Vasco, sou profissional.
Depois da eliminação do Vasco na Copa do Brasil, Morais decidiu deixar São Januário. Surgiram, então, três propostas: Corinthians, Palmeiras e Santos se interessaram pelo jogador. A primeira oferta era para jogar na Série B. As outras, para seguir na elite. Ele optou pela primeira. O esforço corintiano e a visibilidade do clube lhe convenceram.
Na segunda parte dessa entrevista exclusiva, Morais explica por que decidiu disputar a Segundona, projeta um reinício de carreira e também fala sobre a importância de sua família desde que passou a viver sozinho aos 13 anos para se dedicar ao futebol, deixando Maceió para atuar pelo Vasco.
Como foi a negociação com o Corinthians? Vocês chegaram a um acordo rapidamente?
Quando saiu na imprensa minha declaração dizendo que eu queria ir embora, começaram a aparecer propostas. Surgiram ofertas de clubes da Série A e do Corinthians. Antes de eu completar os sete jogos, eu tinha propostas de Palmeiras e Santos. Não pensei muito se era Série A ou B, o que coloquei na balança foram os clubes mesmo. Fiquei muito feliz com as ofertas, mas o Corinthians foi o que mais se interessou e falou diretamente comigo várias vezes.
O Corinthians tem atraído grande visibilidade na Série B. É uma boa chance de tentar se firmar como jogador acima da média?
Sem dúvida. Vim para cá para recomeçar. Quero mostrar tudo que já mostrei e mais. Minha idéia é terminar esse ano forte, aproveitar as férias para recarregar a energia e nos últimos seis meses de contrato voar em campo para deixar meu futuro nas mãos da diretoria.
É por isso que é possível ver você marcando bastante, algo que não acontecia tanto no Vasco?
Quando a cabeça não está boa, não tem jeito. No Vasco eu me desgastava muito, corria de um lado para o outro de maneira errada, até pela situação difícil. Parecia um juvenil correndo. Aqui eu tenho um setor específico e sobra até um gás extra.
E como foi a participação da sua família tanto nessa mudança de vida como na fase difícil no Vasco?
Estou distante da minha família desde os 13 anos, quando fui morar com 120 garotos no Vasco. Por isso valorizo muito as oportunidades que recebo na vida, cada treino, cada jogo. Se não estou feliz, peço para sair. Já pedi desculpas a meus companheiros diversas vezes, sou muito crítico. Tive uma infância muito boa e tive uma base muito boa, por isso agüentei tanto tempo longe de casa.
Seus pais te apoiaram quando você decidiu deixar Maceió e ir para o Rio de Janeiro jogar futebol?
Sim. Eu recebia ajuda de custo de R$ 80 do clube e quando dinheiro acabava ligava triste para meus pais avisando. Aí eles me ajudavam. Depois que virei profissional, minha mãe [Maria Aparecida] contou que meu pai [Manoel] disse um dia que poderia faltar tudo em casa, menos o telefone para poderem falar comigo. Tanto que as contas de telefone sempre foram muito grandes lá.
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